Quarta-feira, 10 de Outubro de 2007

Uma obra dedicada à juventude

Com o agradecimento à Via Occidentalis Editora publicamos o prefácio incluído na obra Ensinar o Holocausto no Século XXI, de Jean-Michel Lecomte, livro direccionado à compreensão do fenómeno do anti-semitismo que recentemente ganhou uma sinistra actualidade entre nós.


* * *

Prefácio à edição portuguesa por

Esther Mucznik

investigadora em assuntos judaicos

 

Em boa hora, decidiu a Via Occidentalis publicar a tradução do livro Ensinar o Holocausto no Século XXI, editado pelo Conselho da Europa.

 

Trata-se, como é referido na apresentação do mesmo, de uma obra  com uma preocupação essencialmente pedagógica com vista a fornecer um material de apoio – simultaneamente conciso, rigoroso e de fácil consulta –  a professores e alunos.

 

Ensinar o Holocausto não é um desafio fácil. Portugal não foi ocupado por Hitler durante a IIª Grande Guerra, nem sofreu as consequências do Holocausto no seu solo. Mas esta feliz circunstância histórica leva a que, praticamente, apenas a população judaica em Portugal  tenha laços afectivos, memórias concretas, uma relação directa com as vítimas do genocídio nazi. Com efeito, quantos jovens em Portugal poderão dizer “o meu avô contou-me...”? Obviamente bem poucos.

 

Talvez por isso o Holocausto nunca foi objecto de debate público em Portugal como o foi, embora tardiamente, nos países ocupados pelo nazismo. Assim para a maioria esmagadora dos alunos e professores portugueses de hoje, o Holocausto é um acontecimento de que ouviram falar na televisão, através de alguns filmes, de alguns livros ou de alguns textos inseridos em manuais escolares – apesar de há uns anos para cá o currículo escolar contemplar mais detalhadamente o estudo do nazismo. Mas para os alunos – e eu tive a oportunidade de o constatar pessoalmente várias vezes – o Holocausto é um acontecimento abstracto, visto frequentemente quase como uma ficção.

 

O facto de já se terem passado mais 60 anos, torna também mais difícil o ensino do Holocausto, não só pela capacidade de atenção e interesse dos alunos, como da própria motivação de professores e autores de manuais. Sabemos como a nossa sociedade – e não só a portuguesa – está virada para a vertigem da actualidade e para o efémero: o que é hoje acontecimento deixa de o ser amanhã. E neste contexto, sessenta anos é uma eternidade...

 

Mas não são estas as únicas dificuldades do ensino do Holocausto, nem talvez as principais. “Não há história mais difícil de contar em toda a história da Humanidade”, afirmou Hannah Arendt. Porquê? Em primeiro lugar pelo sofrimento intenso de um povo, estilhaçando com fragor insuportável os limites do entendimento humano. Até hoje, o genocídio nazi, programado, sistemático e colectivo permanece para a civilização humana como a referência ética do mal absoluto.

 

Mas também porque é uma história que põe radicalmente em causa os valores em que fomos formados, as nossas certezas mais profundas: que através da cultura e da educação o homem se vai aperfeiçoando; que é tanto mais moral quanto mais instruído; que a ciência é uma escola de progresso, racionalidade e aperfeiçoamento. O extermínio nazi deitou por terra essa perspectiva: ocorreu num dos países mais industrializados, povoado por uma das nações mais cultas e instruídas do mundo. “Esperávamos o pior, mas não o impossível”, afirma uma sobrevivente. Depois do Holocausto ficámos a saber que o impossível se tornou uma possibilidade em aberto.

 

Não é, pois, fácil ensinar o Holocausto e sobretudo educar contra o Holocausto. Mas é um assunto que não pode ser evitado porque tem a ver com os próprios fundamentos da nossa civilização. Auschwitz tornou-se, pela negativa, património da humanidade.

 

Na história negra deste período há, no entanto, alguns raios de luz representados por homens e mulheres que contra tudo e contra todos, tiveram a coragem de se opor à barbárie, escondendo e salvando judeus e não judeus, resistentes ou simples pessoas, arriscando frequentemente a própria vida. Ensinar o Holocausto no século XXI  evoca esses “Justos das nações” título a eles atribuído por Israel em reconhecimento da sua acção de salvamento. Entre eles nunca será demais lembrar Aristides de Sousa Mendes, cônsul de Portugal em Bordéus (França) que à revelia do seu governo e arriscando a sua carreira e bem-estar pessoal e familiar concedeu milhares de vistos à multidão de refugiados que procurava desesperadamente escapar da Europa ocupada.

 

Portugal declarou a neutralidade política durante a guerra e desde o seu início muitos judeus e outros perseguidos tentaram escapar aos nazis obtendo um visto de trânsito em Portugal. Mas, à medida que chegavam mais refugiados, a política de fronteiras foi-se tornando mais apertada: os cônsules só podiam conceder vistos depois de autorizados pela polícia política e pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e, após a ocupação alemã de Paris em Junho de 1940, apenas a quem dispusesse de um bilhete de saída de Portugal e de um visto de entrada num país de exílio.  Apesar de todas estas dificuldades, houve mais de cem mil refugiados que conseguiram salvar-se através de Portugal, a maioria entrando clandestinamente ou com vistos dados por Aristides de Sousa Mendes. “Era realmente meu objectivo salvar toda aquela gente, cuja aflição era indescritível”, afirmará mais tarde Aristides de Sousa Mendes.

 

A sua coragem teve um preço exorbitante: Salazar demitiu-o e o cônsul ficou na miséria sendo obrigado a viver da caridade para sustentar a sua numerosa família até à morte em 1954. Outros diplomatas portugueses souberam também fazer prova de humanidade e compaixão: Sampaio Garrido e Teixeira Branquinho, na Hungria; José Luis Archer, em Paris; Lencastre e Menezes, em Atenas; Giuseppe Agenore Magno, cônsul honorário em Milão, todos eles concederam vistos sem autorização, comprometendo as suas carreiras e vidas pessoais.

 

No entanto, nenhum salvou tantos, nem pagou um preço tão elevado como Aristides de Sousa Mendes. Talvez por isso, no Yad Vashem, em Jerusalém, onde o cônsul tem uma árvore plantada em seu nome na Ala dos Justos, as autoridades israelitas considerem que entre todos, foi Aristides de Sousa Mendes que sozinho e contra o seu próprio governo salvou mais vidas. “Talvez seja por isso que a sua árvore é a mais alta de todas”, concluem com um sorriso...

 

A terminar, não quero deixar de saudar a editora Via Occidentalis pela publicação deste livro. Espero que ele contribua decisivamente para ajudar professores e alunos a conhecer e a reflectir sobre a pior catástrofe do século XX. Esta é sem dúvida a melhor maneira de impedir a sua repetição.

publicado por MJ às 14:20
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Terça-feira, 9 de Outubro de 2007

Ensinar o Holocausto aos jovens

EUROPA ENTREVISTA

4ª FEIRA, 10 DE OUTUBRO - 19H05

SÁBADO, 13 DE OUTUBRO - 18H05 (redifusão)

Lisboa 90.4 FM

A propósito da edição em Portugal do livro "Ensinar o Holocausto no século XXI", de Jean-Michel Lecomte (Editora Via Occidentalis), o Europa Entrevista convida esta semana Esther Mucznik, vice-presidente da Comunidade Israelita de Lisboa, para falar das ameaças da extrema-direita na Europa (como a recente profanação de campas no Cemitério Israelita em Lisboa) e do actual momento do processo de Paz no Médio Oriente.

Europa Entrevista : uma edição de Mónica Peixoto.

Emissão também disponível online em www.radioeuropa.fm / Jazza-me muito... ou através da powerbox da TV Cabo.
publicado por MJ às 10:57
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Sexta-feira, 15 de Junho de 2007

Historiador do Holocausto ganha 'Prémio da Paz dos Livreiros Alemães'

O Prémio da Paz dos Livreiros Alemães foi hoje atribuído ao historiador israelita Saul Friedlander, pelos seus trabalhos sobre o Holocausto, entre cujas vítimas se contam os seus pais.
Em comunicado, a Associação dos Livreiros Alemães sublinha que Friedlander, 74 anos, é um dos últimos historiadores que testemunharam a "perseguição e a destruição dos judeus na época do terror nazi na Europa".

O historiador "permitiu a homens e mulheres reduzidos a cinzas fazerem ouvir uma queixa, um grito. Deu-lhes uma memória e os seus nomes" - acrescenta. Existente desde 1950, o Prémio da Paz dos Livreiros Alemães foi atribuído em 2006 ao ensaista e sociólogo alemão Wolf Lepenies, e em 2005 ao escritor turco Orhan Pamuk, que um ano mais tarde ganhou o Prémio Nobel da Literatura.

Saul Friedlander nasceu em 1932, em Praga, filho de pais judeus que foram mortos em Auschwitz, sendo sobretudo conhecido pela sua obra "O Terceiro Reich e os Judeus", considerada uma síntese do seu trabalho como historiador.

Após um primeiro volume sobre "Os Anos da Perseguição" (1933-1939), editado em 1997, acaba de publicar um segundo volume intitulado "Os Anos do Extermínio" (1939-1945).
publicado por MJ às 23:47
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Segunda-feira, 16 de Abril de 2007

Agenda: Primo Levi e Amos Oz

O Museu da Resistência de Turim e o Centro de Resistência de Lyon inauguram no próximo dia 17 uma mostra sobre a vida de Primo Levi. Um dia antes, em Nova Iorque, será entregue ao escritor Philip Roth um prémio da Fundação Grinzane Cavour dedicado a Levi. Em 24 de Maio, também em Turim, é celebrado um congresso literário com o tema «Os lugares de Levi, entre a literatura e a memória». Em Espanha a editora Belacqua publicou recentemente uma biografia escrita por Ian Thomson.

Em Portugal, o jornal Público oferece, com a sua edição de Terça-feira, dia 17, o livro Contra o Fanatismo: «Nascido na Jerusalém dilacerada pela guerra, Amos Oz observou em primeira mão as consequências nefastas do fanatismo. Neste livro, composto de três ensaios, o autor oferece-nos uma visão única sobre a verdadeira natureza do fanatismo e propõe uma abordagem racional que permita resolver o conflito israelo-palestiniano.
A brilhante clareza destes ensaios, acompanhada pelo sentido de humor irónico de Amos Oz dão uma nova vida a este debate.»
«Amos Oz é a voz da sanidade que sobressai no meio da confusão.» Nadine Gordimer
«O livro de Amos Oz Contra o Fanatismo é um relâmpago no meio da noite, com a diferença de ficar a brilhar durante muito tempo.» Francisco José Viegas
publicado por MJ às 01:24
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Terça-feira, 10 de Abril de 2007

Aristides de Sousa Mendes

Aristides de Sousa Mendes - Herói do Holocausto
de José Ruy

Preço: EUR 11,00
Editor: Âncora Editora
ISBN: 9789727801374
Ano de Edição: 2005
N.º de Páginas: 32

Natural de Cabanas de Viriato, Aristides de Sousa Mendes, é um dos filhos mais ilustres do Concelho de Carregal do Sal. Diplomata da época do holocausto nazi, o Cônsul foi, acima de tudo, um homem generoso, exemplo de coragem e tolerância numa época em que as directivas do Governo Nacional eram colocadas acima de qualquer imperativo de consciência. E esse foi, acima de qualquer outro, o motivo que transformou Aristides de Sousa Mendes numa das grandes figuras do panorama histórico e político nacional. Através do desfolhar destas breves páginas pretende-se divulgar, dar a conhecer, de uma forma cativante, o Homem cujo gesto humanitário salvou a vida a mais de 30 mil pessoas que eram perseguidas pelo regime de Hitler. Foi este acto que conduziu Aristides de Sousa Mendes e toda a sua família à miséria. Aliás, o Cônsul faleceu, sozinho, no Hospital da Ordem Terceira, em Lisboa, no ano de 1954. Mas o seu gesto só muito mais tarde viria a ser reconhecido. No ano em que lhe prestamos homenagem, quando passa meio século sobre a sua morte, convidamo-lo a descobrir passagens da sua vida a que continuam alheios muitos de nós. Aristides da Sousa Mendes, estou em crer, merece-nos este carinho, este gesto... esta memória! (Existe uma edição desta obra em hebraico).
Livro recomendado para o 6º ano de escolaridade, destinado a leitura autónoma e/ou a leitura com apoio do professor ou dos pais.
publicado por MJ às 12:18
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Segunda-feira, 9 de Abril de 2007

O Leão da Montanha

Testemunha viva de um dos episódios mais bárbaros da História, Arie Yaari (85 anos) retrata com uma riqueza de detalhes os horrores da perseguição nazi aos judeus.
A obra, lançada recentemente pela Editora Sêfer, serve também de alerta sobre a questão dos preconceitos e da intolerância com consequências imprevisíveis e nefastas para a humanidade.
O autor faz parte de um grupo de sobreviventes do Holocausto que contribuiu para o estudo do cineasta Steven Spielberg, Survivors of the Shoah, com depoimentos escritos e em vídeo.
No início de seu livro Arie Yaari cita, «Nada é mais perigoso do que uma pessoa convencida de sua superioridade moral, pois nega a seus opositores justamente este predicado».
O Leão da Montanha é um relato emocionante, verdadeiro, de um porta-voz de 6 milhões de judeus assassinados no Holocausto nazi e que não puderam contar ao mundo o que viveram.
Em 336 páginas, Arie Yaari conta a vida pobre num pequeno vilarejo judeu na Europa antes da 2ª Guerra, a experiência pessoal no meio do inferno dos campos da morte nazis, o exemplo da superação e optimismo, a luta pela independência do Estado de Israel e, finalmente, no Brasil, terra que escolheu como pátria amada.
Arie adoptou uma missão, independente de qualquer sofrimento: «nunca desistir dos seus sonhos». Assim, ele redescobriu a vida no Brasil. Fugiu dos campos da morte e encontrou a então sonhada paz nos Campos do Jordão, onde prospera ao lado da sua família e amigos no ramo da hotelaria.

A Editora Sêfer é distribuida em Portugal por EuroEnigma (tel.: 96.532.4201)
publicado por MJ às 22:23
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Judeus em Portugal durante a II Guerra Mundial

Judeus em Portugal durante a II Guerra Mundial
Irene Flunser Pimentel

Preço: EUR 30,00
Editor: Esfera dos Livros
ISBN: 9789896260132
Ano de Edição: 2006
N.º de Páginas: 436

A partir dos anos 30, com a subida de Hitler ao poder e durante a II Guerra Mundial, Portugal tornou-se num porto de abrigo para milhares de judeus e refugiados políticos que fugiam das perseguições nazis e do Holocausto. Chegavam por via terrestre, através de Espanha, ou em navios fretados, muitas vezes graças à ajuda de cônsules portugueses, como Aristides de Sousa Mendes, que desobedecendo às ordens do regime e às políticas de restrição de entrada da PVDE, lhes concedeu vistos que significaram a sua salvação.
publicado por MJ às 13:14
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