Domingo, 3 de Junho de 2007

Irmãos Scholl

Nova comunidade no Orkut dedicada aos irmãos Scholl e ao grupo Rosa Branca.
publicado por MJ às 10:55
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Terça-feira, 8 de Maio de 2007

Resistência alemã - Stauffenberg

O único acto de resistência interna que quase foi eficaz na tentativa de assassinar Adolf Hitler.

Em 1940, teve início nos arredores de Rastenburg, na Prússia Oriental, a construção do "Reduto do lobo", que serviria a Hitler de quartel-general durante a campanha da Rússia, até 22/12/1944. Como este abrigo dispunha de fortes medidas de segurança, apenas um reduzido numero de pessoas tinha, pela natureza do seu cargo, acesso directo ao Fuhrer. Entre elas contava-se Claus von Stauffenberg, coronel do Estado-maior das forças de reserva. Stauffenberg aterrou em 20 de Julho de 1944, as 10.15 h., no aeródromo de Rastenburg e percorreu numa viatura de serviço os 6 km. que o separavam do "Reduto do lobo"; passou a casa da guarda no portão sul e saiu do carro junto do messe II, onde tomou o pequeno almoço. Às 11 h. dirigiu-se a uma reunião no barraca do Estado-Maior do comando do Wehrmacht, e posteriormente, cerca das 11.30 h. ao Alto Comando. Aqui, com a ajuda de Werner von Haeften, Stauffenberg meteu o explosivo no pasta, quebrou a ampola de ácido do detonador e seguiu imediatamente para a barraca de operações. Após a chegada de Hitler, cerca das 12.30 h., Stauffenberg, que se encontrava próximo, colocou a pasta debaixo do mesa e invocou um pretexto para abandonar o local. Dirigiu-se a pé às instalações dos ajudantes, onde se apercebeu da explosão, e tomou, juntamente com von Haeften, uma viatura que o aguardava. Ao abandonar o "Reduto do lobo" pode lançar um olhar à barraca de operações destruída, depois atingiu o aeródromo instalado provisoriamente junto a Wilhelmsdorf e partiu às 13.15 h. para Berlim, onde chegou por volta das 16 h.

Após ter colocado a bomba no "Reduto do lobo", Stauffenberg regressou ao Ministério da Guerra e assumiu aí o comando do levantamento, ao que foi apoiado pelo coronel Mertz von Quirnheim.

A explosão, às 12h42, matou quatro das 24 pessoas na sala. Hitler sobreviveu.
Na capital alemã, os conspiradores comunicaram por telefone, por volta das 15 horas, convencidos do êxito da missão: "Hitler morreu!" Duas horas mais tarde, a notícia foi desmentida. Na mesma noite, Stauffenberg, Von Haeften, Von Quirnheim e Friedrich Olbricht foram executados. No dia 21 de julho, os mortos foram enterrados em seus uniformes e condecorações militares. Mais tarde, Himmler mandou desenterrá-los e ordenou sua cremação. As cinzas foram espalhadas pelos campos.


Percurso de Stauffenberg em 20 de Julho de 1944:
1 Fortificações II - oeste, construídas em 1944
2 Casa da guarda sul
3 Bunker da defesa anti-aérea
4 Pessoal
5 Abrigo
6 Cinema
7 Fortificações oeste, construídas em 1944
8 Barracão de operações, local do atentado de Stauffenberg
9 Abrigo para visitantes, residência de Hitler de Julho a Setembro de 1944
10 Chefe dos Serviços de Imprensa do Reich
11 Bunker de transmissões
12 Garagem
13 Batalhão de guarda pessoal do Fuhrer, alojamentos
14 Serviços de Segurança do Reich
15 Ajudantes pessoais; médicos
16 Ministro dos Negócios Estrangeiros do Reich (von Ribbentrop)
17 Pessoal, garagem
18 Ministro do Armamento do Reich (Speer)
19 Ajudantes da Wehrmacht
20 Messe II
21 Bunker de Hitler, concluído em Setembro de 1944
22 Messe I
23 Alto Comando da Wehrmacht
24 Chefe do Alto Comando da Wehrmacht, marechal de campo Kettel
25 Chefe do Estado Major da Wehrmacht, coronel-general Jodi
26 Alto Comando da Marinha
27 Marechal Goring
28 Alto Comando da Força Aérea
29 Almirante Donitz
30 Bunker de Goring, construido em 1944
31 Pista de aterragem para aviões de pequeno porte
32 Posições de infantaria
33 Casa da guarda leste

publicado por MJ às 21:22
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Resistência alemã - Weisse Rose

No dia em que se comemora mais um aniversário sobre o final da II Guerra Mundial recordemos a resistência interna alemã ao nazismo que apesar de escassa e praticamente ineficaz merece uma referência especial pela coragem e empenho de uma minoria que tentou mudar o rumo dos acontecimentos e alertar os seus concidadãos para o apocalipse a que o nazismo conduzia.

O novo cinema alemão tem vindo a abordar mais descomplexadamente a temática da II Guerra Mundial e Sophie Scholl – Os Últimos Dias é interessante do ponto de vista documental ao contar a história dos últimos cinco dias que antecederam à morte da jovem Sophie Scholl, estudante, activista e membro do grupo da resistência conhecido como Weisse Rose (Rosa Branca), criado durante a Segunda Guerra Mundial.
Munique, 1943: Hitler está a devastar a Europa; um grupo de jovens universitários recorrem à resistência passiva como arma para combater os nazis e a sua desumana máquina de guerra. É então que se forma o movimento de Resistência Rosa Branca.
Sophie Scholl (Julia Jentsch) é a única mulher do grupo. Em 18 de Fevereiro Sophie e Hans Scholl (Fabian Hinrichs) são surpreendidos a distribuir panfletos contra o regime e os dois são detidos pela Gestapo. Pouco tempo depois são presos os restantes membros do grupo.
Nos dias que se seguem desenvolve-se um intenso duelo psicológico no interrogatório de Sophie com o oficial Mohr (Alexander Held) da Gestapo. Ela mente e nega, desesperada por proteger o seu irmão e os restantes companheiros. Mohr oferece uma saída a Sophie para escapar à morte, mas ela recusa-se a trair os seus ideais. A partir do momento em que fica a saber que o irmão confessou tudo, Sophie deixa de mentir. “Eu fiz tudo… e orgulho-me disso”.
Em 22 de Fevereiro Sophie e Hans são acusados de alta traição e condenados à morte. A execução acontece ainda no mesmo dia. Os restantes membros são executados no mesmo ano.
Os membros da Rosa Branca, principalmente Sophie Scholl, são ainda hoje respeitados e todas as terras têm ruas com os seus nomes, em memória dos estudantes que tentaram, de forma heróica, por fim à crueldade e à enorme indiferença existente na Alemanha daqueles tempos.

Sophie Scholl – Os Últimos Dias (Sophie Scholl)
Vencedor de dois Ursos de Prata no Festival de Berlim
“Melhor Realizador” para Marc Rothemund e “Melhor Actriz” para Julia Jentsch
Realização: Marc Rothemund
Actores:Julia Jentsch, Alexander Held, Fabian Hinrichs, Johanna Gastdorf, André Hennicke, Florian Stetter
Género: Drama
Título original: Sophie Scholl – The Final Days
Alemanha: 2005
Duração: 1h57m

Classificação: M/16 anos

* Com a colaboração da Teresa que também recomenda a seguinte bibliografia: Die weiße Rose. (Lernmaterialien) (Paperback) by Inge Scholl (Author), Iris. Felter (Author), Jette. Jörgensen (Author); Resistance against the Third Reich: 1933-1990 (Studies in European History from the Journal of Modern History) by Michael Geyer page 174, and page 181; Nazi Terror: The Gestapo, Jews, and Ordinary Germans by Eric A. Johnson; Alternatives to Hitler: German Resistance under the Third Reich by Hans Mommsen; Uncommon Dissent: Intellectuals Who Find Darwinism Unconvincing by John Wilson; The Racial State: Germany 1933-1945 (Burleigh) by Michael Burleigh; In the Name of the Volk: Political Justice in Hitler's Germany by H. W. Koch; Lonely Planet Munich (Lonely Planet City Guides) by Jeremy Gray page 97; The Other Price of Hitler's War: German Military and Civilian Losses Resulting From World War II (Contributions in Military Studies) by Martin K. Sorge.
* Ler também «Quase em Português»

publicado por MJ às 20:58
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Segunda-feira, 30 de Abril de 2007

André Trocmé

Desafiando o governo colaboracionista de Vichy, os habitantes de Le Chambon-sur-Lignon esconderam nas suas casas 5000 judeus, na maioria crianças. Deram-lhes refúgio, identificações falsas, educação para os filhos, cartas da racionamento e transporte seguro para a Suíça. Descendentes dos huguenotes, os primeiros protestantes da França católica, sabiam o que eram estar na pele dos perseguidos. Sob a liderança do jovem padre André Trocmé, o povo de Chambon sentiu que era seu dever ajudar as pessoas necessitadas, sem pensar que as suas acções podiam ser heróicas ou perigosas.

Biografia de André Trocmé
publicado por MJ às 10:06
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Sexta-feira, 13 de Abril de 2007

A Sublevação do Gueto de Varsóvia

O Gueto de Varsóvia foi estabelecido formalmente em 2 de Outubro de 1940. Seis semanas mais tarde, em 15 de Novembro, foi cercado por muros, como se vê nesta foto de 1941. No gueto, os direitos dos judeus eram limitados, as suas condições de vida eram deploráveis e estavam restritos a uma pequena área, facilitando a deportação para os campos de extermínio.


Durante a Segunda Guerra Mundial, num dos períodos mais sanguinários da história da Humanidade, a perseguição aos judeus assumia proporções inéditas nos países ocupados pela Alemanha.
Fiel ao programa de eliminação dos judeus, traçado no livro Mein Kampf (A Minha Luta), Hitler estava determinado a atingir os seus objectivos e a realizar a sua obra. Grande parte dos judeus que tinham sido deportados da Alemanha e da Áustria já haviam morrido nos campos de concentração, enquanto milhares de outros estavam a caminho do mesmo trágico fim.
No entanto, o destino final das vítimas ainda era ignorado pela maioria. Apenas o Vaticano, em função da presença dos representantes ao redor dos campos da morte nazis, tinha informações precisas sobre o que estava acontecendo aos judeus. Porém, apesar de receber constantemente relatórios sobre os factos, o papa Pio XII – então líder supremo da Igreja Católica – permaneceu calado. Nada, então, podia deter o monstruoso plano de extermínio de Hitler, face ao silêncio daquela que era a única potência moral que detinha o poder e os meios para modificar a grande indiferença – ou mesmo conivência –dos habitantes das povoações de onde os judeus eram deportados.
[...] A parte que tocou ao povo judeu disperso na Diáspora (Dispersão) foi calcada na perseverança e resignação e na esperança de um dia ver, finalmente, a justiça triunfar sobre o ódio – um ódio que fora disseminado pela Europa, durante 18 séculos, através de ensinamentos cristãos baseados em calúnias e desprezo. Mas as raízes desse mal já eram tão profundas que o povo judeu, mais uma vez, teve que vivenciar as trágicas consequências do preconceito.
Quando o governo alemão se instalou na Polónia, em Outubro de 1939, uma de suas primeiras providências foi transferir e aprisionar, no exíguo espaço do antigo bairro judeu, os 400 mil judeus de Varsóvia. Em condições normais, esse bairro tinha a capacidade para abrigar apenas 60 mil pessoas. Um muro foi rapidamente levantado para isolar completamente o bairro, que tornou-se um "gueto" no sentido mais exacto e nefasto da palavra. Aos judeus de Varsóvia presos no gueto somaram-se rapidamente 100 mil outros, evacuados dos povoados vizinhos. Toda essa população vivia em condições sub-humanas. Em cada cómodo disponível viviam em média 13 pessoas, enquanto grande parte da população não tinha sequer um abrigo.
A resistência judaica começou a formar-se no início de 1940, mas apenas no dia 2 de Dezembro de 1942 foi organizado um grupo de combate, reunindo todas as tendências políticas possíveis.
No dia 9 de janeiro de 1943, Himmler, chefe supremo da Gestapo, chegou, de surpresa, a Varsóvia, indo até o gueto. Ali se decidiu a ordem de destruí-lo e exterminar todos os seus habitantes. Assim, no dia 18 de janeiro de 1943, vários batalhões da SS marcharam rumo ao gueto, mas, pela primeira vez, os alemães foram recebidos ao som de granadas e metralhadoras. Após sofrerem muitas baixas, as tropas da SS foram obrigadas a retirar.
Os líderes da sublevação, encabeçados por Anilevitch, então com 24 anos, fizeram um apelo ao mundo exterior. Palavras carregadas de emoção foram transmitidas por uma rádio clandestina: "Declaramos guerra à Alemanha, a declaração de guerra mais desesperada que já foi feita. Organizamos a defesa do gueto, não para que o gueto possa defender-se, mas para que o mundo veja a nossa luta desesperada como uma advertência e uma crítica".
Depois de uma trégua de três meses, em 19 de Abril de 1943, forças alemãs e colaboracionistas polacos, ucranianos e lituanos cercaram o gueto. Por duas vezes, os atacantes foram rechaçados, com inesperada força, pelas armas dos defensores do gueto. Após sofrer perdas consideráveis, os atacantes acabaram fugindo de forma desorganizada. Para os defensores do gueto, o desespero era a sua força e no telhado mais alto tremulava a bandeira azul e branca de Sião.
Diante de tamanha resistência, o comandante alemão Jürgen Stroop recebeu ordem pessoal de Hitler para usar de todos os meios a fim de destruir o gueto: artilharia, blindados, lança-chamas, gás asfixiante. Era uma luta corpo a corpo nas ruas, nas casas, sala por sala, sobre os telhados, nas caves, nos esgotos. Finalmente, no ataque final, a aviação alemã teve que intervir para acabar com os últimos focos de resistência.
Em 8 de Maio de 1943, Mordechai Anilevitch, a esposa e seus companheiros tombaram, armas em punho, após recusarem render-se, mesmo com a promessa de terem as vidas poupadas.
Em 16 de Maio, o general Stroop enviou um telegrama a Hitler: "O bairro judeu de Varsóvia já não existe". O general do "Herrenvolk" (Povo de Senhores, tão exaltado pelos nazis) estava orgulhoso de seu feito. Para festejar, mandou dinamitar a grande sinagoga de Varsóvia, "comemorando", assim, a fase final da exterminação daquela que havia sido uma das grandes comunidades judaicas da Europa.
Ao mesmo tempo, Schmuel Zigemboim, único judeu membro do Conselho polaco, exilado em Londres, suicidou-se para protestar contra aquilo que chamou de "conspiração do silêncio". Numa nota enviada à imprensa, dizia: "Ao assistir sem reacção alguma à matança de milhões de seres inocentes e indefesos, os países livres do mundo ocidental tornaram-se cúmplices dos assassinos".
Essa acusação era dirigida à resistência polaca, que ignorou os apelos feitos pelos moradores do gueto. Excepto alguns patriotas – que o Yad Vashem (Instituto em Memória do Holocausto, em Jerusalém) mais tarde homenagearia – os polacos, na sua grande maioria, preferiram deixar o "problema judeu" por conta dos alemães. Quando algumas centenas de sobreviventes do gueto puderam juntar-se à resistência, em sua maioria polaca, muitos foram assassinados de forma vil pelos fascistas polacos que colaboravam com os nazis. Mais tarde, quando eles mesmos pediram ajuda aos russos, estes tiveram a mesma atitude: fingiram não ouvir, permitindo aos alemães massacrar sem piedade 150 mil polacos.
Mas as acusações mais amargas foram feitas aos dirigentes do mundo livre. Todos podiam ter feito muito para impedir ou pelo menos retardar o genocídio mais monstruoso da História. Mas nada fizeram. Só viram a terrível realidade da barbárie nazi depois de descobertos os campos da morte, os fornos crematórios ainda fumegantes e os restos humanos empilhados.
Quando o monstro nazi foi abatido, o mundo, estarrecido, gritou: "Nunca mais!" As nações livres juraram ser, no futuro, vigilantes quanto a qualquer nova tentativa de crimes contra a humanidade. Mas, infelizmente, por várias vezes, esse juramento não foi cumprido e eles foram e são cometidos até os dias de hoje.

Extraído de www.morasha.com
publicado por MJ às 12:44
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Segunda-feira, 9 de Abril de 2007

A lista de Irena

O texto que segue, publicada no jornal britânico The Independent, de 17 de Março findo, parece adequada para esta semana, e logo nestes tempos de agora, em que se cuida mais da morte (de crianças e não só) que da vida.

«É a versão feminina de Oskar Schindler. Vive num lar da terceira idade, na Polónia esta antiga enfermeira que, sem o aparelho industrial ou o poder financeiro daquele, salvou duas vezes mais judeus dos horrores do Holocausto. Cerca de 2500 crianças foram libertas do gueto de Varsóvia e de uma morte quase certa nos campos de concentração, tudo graças a Irena Sendlerowa. Hoje com 97 anos, Irena tirava de lá bébés e crianças dentro de sacos, através de esgotos e até escondidos debaixo de macas em ambulâncias. Eram então, com identidades falsas, entregues a famílias adoptivas não-judias, que as ensinavam a falar polaco e a balbuciar orações cristãs para poderem enganar os oficiais pesquisadores da Gestapo.

Indigitada para o prémio Nobel da Paz, Irena diz que não foi uma heroína, mas as centenas de crianças judias que tiveram a sorte de crescer graças a ela não concordam. «Para mim, as suas acções foram de puro heroísmo. Sei que ela não gosta e diz modestamente que se limitava a fazer o que qualquer ser humano teria feito, mas não há outra palavra para isso» diz Elzbieta Ficowska, uma das crianças salvas. Com a guerra a alastrar pela Europa, Elzbieta e quase 400 000 outros judeus polacos foram arrebanhados para uma área sensivelmente do tamanho do Central Park de New York. Estava-se em Novembro de 1940 e assim nascia o Gueto de Varsóvia. Os pais passaram os meses seguintes vendo os filhos brincando por detrás de muros com mais de 3 metros de altura e com vidros partidos no seu topo, enquanto eles próprios tentavam sobreviver com rações mínimas e proteger as famílias dos surtos de tifóide e tuberculose que grassavam naqueles espaços sobrepovoados.
A mãe de Elzbieta costumava transportá-la numa mochila. Mas depressa os alemães deram por este disfarce e certo dia um soldado espetou-a com a baioneta. O bébé teve a sorte de escapar nessa altura, mas o episódio determinou a mãe a medidas radicais. Assim, quando Elzbieta tinha só 5 meses, escondeu-a numa caixa de ferramentas, meteu-o numa carreta de tijolos e esgueirou-a para a liberdade.
Separar crianças dos pais era de cortar o coração. Irena lembra numa entrevista divulgada no site da Associação das Crianças do Holocausto na Polónia: «Vimos cenas infernais. O pai a concordar e a mãe não. A avó a embalar ternamente o bébé, chorando amargamente, e negando-se a abandonar o neto fosse a que preço fosse».Alturas houve em que o impossível era realmente impossível. «Por vezes tínhamos que deixar estas infelizes famílias sem lhes levar os filhos» diz Irena. «Ia-se no dia seguinte ver o que acontecera à casa e já toda a gente fora levada no comboio para os campos da morte».
Nem assim o pesadelo nazi acabava para as crianças com a sorte de ser salvas. Embora supostamente em segurança, estavam ainda sujeitas às rusgas ocasionais da Gestapo. «Sei de casos em que a única hipótese de sobrevivência era o peitoril exterior da janela, ou atrás de uma cortina, mantendo ali a criança o tempo necessário, com as mãos já dormentes a segurá-la até os alemães partirem», conta Irena. Às vezes o risco era tanto que tinha de se arranjar uma segunda casa de acolhimento. Chorando, um miúdo perguntou certa vez a Irena: «Diz-me quantas mães consegues arranjar, porque esta é já a terceira para onde vou».A pena de morte para quem ajudasse judeus na Polónia ocupada pelos nazis não bastou para deter a enfermeira, cuja profissão lhe permitia a importantíssima possibilidade de entrar no gueto. Católica, Irena (cujo nome clandestino era Jolanta) decidiu mostrar a sua solidariedade com o povo judeu usando a faixa obrigatória com a estrela de David quando entrava no gueto. «Fui educada acreditando que uma pessoa deve ser ajudada se está a afogar-se, independentemente da religião ou da nacionalidade». «Não somos heróis por andar a salvar crianças», diz ela. «De facto, a verdade é o contrário – e continuo a ter escrúpulos do pouco que fiz». Em pleno turbilhão da guerra, Irena teve presença de espírito para guardar registos minuciosos dos que salvava, para mais tarde ser possível reuni-los à sua família. Mas quando a guerra acabou muitos dos parentes haviam sido mortos no Holocausto, a maior parte deles no campo da morte de Treblinka, onde cerca de 300 000 judeus foram assassinados só no Verão de 1942. Irena, porém, nunca desesperou. Cuidadosamente, copiava os detalhes relativos a cada criança em folhas de papel para cigarro – e, à cautela, em duplicado. Estas preciosas informações eram então seladas em duas garrafas de vidro e enterradas no jardim de uma colega.
Embora trabalhando com a protecção de Zegota (associação secreta apoiada pelo governo polaco no exílio) e com inúmeros colaboradores, Irena era a única que cuidava, com grande risco, de manter e proteger estes arquivos. O desastre esteve iminente em Outubro de 1943 quando um pelotão nazi chegou certa madrugada, revirou toda a casa e levou Irena para o quartel da Gestapo. Foi aí torturada, na tentativa de lhe sacarem informações. Partiram-lhe ossos das pernas e dos pés, mas a sua boca não se abriu.«Ainda tenho marcas no corpo do que esses super-homens alemães me fizeram», disse ela. «Fui condenada à morte… mas além disso, havia também a ansiedade de, morrendo, desaparecer o único rasto dessas crianças». Só que, sem ela saber, os seus colegas de Zegota trabalhavam por detrás da cortina e, com um punhado de dólares, conseguiram corromper um oficial alemão para a deixar fugir. «É indescritível o que se sente a caminho da própria execução para só no derradeiro momento ver que se foi resgatado», recorda ela. No dia seguinte, as autoridades alemãs, ainda ignorantes da sua fuga, afixavam cartazes por toda Varsóvia anunciando que ela fora fuzilada. Depois disto, Irena passou a levar a uma vida clandestina, com identidades falsas, escondida das vistas oficiais e sem poder voltar a casa. Quando a mãe lhe morreu, pouco depois de ela escapar ao pelotão de fuzilamento, apareceram agentes da Gestapo no funeral interrogando os parentes sobre a filha da morta.
Irena foi um das primeiras a ser recrutada por Zagota (Comissão Konrad Zagota, de seu nome completo). A organização fora estabelecida em 1942 – quando ficou clara a determinação dos alemães a exterminar toda uma raça – para congregar e reforçar os esforços dispersos de ajuda aos judeus. A iniciativa para a sua criação partiu de outras duas polacas – Zofia Kossak, escritora conservadora católica, e Wanda Krahelska-Filipowicz, activista socialista. Mas este par entrou em outras redes já extensas, como a de enfermeiros e assistentes sociais de Irena, que aparecera quase organicamente face à limpeza étnica dos nazis. Konrad Zegota era uma personagem inteiramente fictícia, mas o nome «acabou por cobrir todas as actividades de ajuda aos judeus», segundo Irene Tomaszewski e Tecia Werbowski, autoras de um livro sobre esta organização.
Ainda assim, muitos residentes em Varsóvia nunca haviam ouvido falar deste grupo até quando, há uma década, se descerrou perto do antigo gueto uma placa de mármore em sua honra. O regime comunista polaco do após-guerra havia estimulado o anti-semitismo e a história destas pessoas comuns mas extraordinariamente corajosas ficara quase esquecida. A reparação oficial aconteceu só agora, com a actual família governamental a reconhecer os méritos de Irena Sendlerowa, e ironicamente usando uma expressão que, como ela sempre tinha dito, «a irritava grandemente»… O parlamento declarou-a «heroína nacional» e apoiou a sua indigitação para o prémio Nobel da Paz. Demasiado fraca para assistir à cerimónia, Irena enviou uma carta muito simples. «Cada crianças salva com a minha ajuda e a de todos os admiráveis mensageiros clandestinos que já não vivem justifica a minha existência na terra e não qualquer título de glória», escreveu ela. Já mais de meio século passou desde o inferno do Holocausto, mas o seu espectro ainda paira sobre o mundo e não nos deixa esquecer a tragédia que aquilo foi».
Tradução: Álvaro Monjardino (2007-04-05), in A União
publicado por MJ às 14:35
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